A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu negar provimento a um recurso (agravo regimental) na Ação Penal (AP) 666, na qual o Ministério Público Federal (MPF) acusa o deputado federal (PRP-BA) Jânio Natal Andrade Borges pela suposta prática dos crimes de falsidade ideológica (artigo 299) e sonegação de contribuição previdenciária (337, inciso I), ambos do Código Penal. Ao examinar o recurso, o Plenário do STF entendeu que deveria permanecer a decisão do relator, ministro Marco Aurélio, que determinou o desmembramento do processo, uma vez os outros dois acusados nos autos (Aloízio Vaz Lacerda Filho e Antônio Miguel Ballejo) não têm prerrogativa de foro para serem julgados pelo Supremo.
A Procuradoria-Geral da República (PGR) sustenta, no recurso, a necessidade de reforma da decisão do relator, com base no fato de as circunstâncias nas quais foram praticados os delitos imporem o julgamento conjunto dos réus, sob pena de haver prejuízo no exame das provas a serem apreciadas pelo Supremo. A PGR defende que as condutas delituosas “estão relacionadas de modo indissociável, tanto que é possível enquadrá-las nas três hipóteses de conexão previstas no artigo 76 do Código de Processo Penal”.
Essas três hipóteses, conforme o procurador-geral, são: conexão intersubjetiva, devido ao concurso de agentes para a prática dos delitos; conexão teleológica, porque a inserção dos dados falsos nas guias do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e nas Informações à Previdência Social (GFIP) teve o fim específico de reduzir as contribuições previdenciárias devidas pelo ente público, permitindo-lhe, por consequência, a obtenção da certidão negativa de débitos; e conexão probatória, porque a falsidade ideológica, no caso, já configura prova do crime tipificado no artigo 337 do Código Penal.
Postura rígida da Corte
De acordo com o ministro Marco Aurélio (relator), a competência do Supremo é de direito estrito, está delimitada na Constituição Federal. “Normas instrumentais comuns, como são as alusivas à conexão e à continência, não a dilatam. Então, cumpre sanear o processo”, disse.
O relator afirmou que, conforme a Constituição Federal (artigo 102, CF), “as regras reveladoras da prerrogativa de foro consubstanciam exceção, consubstanciam competência funcional, absoluta, portanto”. Segundo ele, normas instrumentais comuns, como são as do Código de Processo Penal, relativas à continência e à conexão, “não implicam aditamento ao que previsto na Lei Maior, sob pena de esta perder a característica que lhe é própria, ou seja, a rigidez”.
O ministro Marco Aurélio salientou que o princípio do juiz natural se mostra inerente à cidadania. Os demais acusados – Aloízio Vaz Lacerda Filho e Antônio Miguel Ballejo – têm o direito ao devido processo legal “e este há de fazer-se com a atuação da primeira instância e com a recorribilidade cabível”. Segundo ele, o Supremo tem adotado uma postura rígida quanto à competência. “Se não for assim, em todo o caso em que houver coautoria, nós concentraremos a acusação no Supremo ainda que o acusado não detenha prerrogativa de foro”, ressaltou ao votar pelo desprovimento do recurso.
Divergência
O ministro Teori Zavascki votou pelo provimento do agravo regimental. Ele considerou que a regra é interpretar restritivamente a competência por prerrogativa de foro, porém salientou que “existem certas competências implícitas que decorrem da natureza das coisas”.
“Eu não vejo como se desmembrar em duas ações penais diferentes em se tratando de uma conduta praticada em coautoria, nessas circunstâncias”, disse, acrescentando que há certos delitos que, por natureza, são cometidos por mais de um agente, e citou como exemplo o crime de quadrilha. Acompanharam a divergência os ministros Joaquim Barbosa, Rosa Weber e Gilmar Mendes.