O vice-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Cezar Peluso, atuou, nesta quinta-feira (15), como mediador do workshop sobre o tema Práticas no Tratamento de Presos no Sistema de Justiça Criminal, durante o 12º Congresso da Organização das Nações Unidas sobre Prevenção ao Crime e Justica Criminal, que se realiza em Salvador (BA).
O ministro é presidente do Comitê Permanente da América Latina para Revisão das Regras Mínimas da ONU para o Tratamento de Presos, estabelecidas na Convenção de Genebra (Suíça, em 1955). O comitê elaborou um anteprojeto de convenção internacional que está sendo debatido na capital baiana, juntamente com propostas no mesmo sentido elaboradas por grupos congêneres dos demais continentes.
Durante o workshop de hoje, representantes da própria ONU e de uma série de paises discorreram sobre problemas nas prisões de grande parte deles e apresentaram sugestões de alternativas. Entre os expositores figurou o relator especial da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre Tortura, o austríaco Manfred Nowack. Ele disse que existem, na atualidade, 10 milhões de presos em todo o mundo que passam por situações degradantes, não tendo respeitados os seus direitos humanos.
Alternativa
Ele sugeriu como uma das alternativas para melhorar a situação a adoção do sistema prisional da Dinamarca, que busca seguir as regras preconizadas pela ONU, levando em consideração, ao máximo possível, as necessidades individuais do preso em busca de sua reabilitação e ressocialização, reduzindo assim o risco de reincidências.
Nowack admitiu, entretanto, que a realidade na maioria dos paises é bem diferente. Segundo ele, em muitos paises os presos não têm sequer respeitados os direitos a necessidades mais elementares, como comida, água, cama, roupa, saúde, higiene pessoal e privacidade.
Ele relatou o caso da Guiné Equatorial, país africano em que as famílias têm de levar comida e água para os presos e, até, sacos plásticos para eles fazerem suas necessidades, pois não há banheiros em alguns presídios.
Por outro lado, há países, como o Paraguai e a Indonésia, onde os presos pagam diárias pelas celas que ocupam. Já em algumas ex-repúblicas soviéticas, como a Geórgia e o Casaquistão, há presos mantidos em solitária por longo tempo. Um caso extremo por ele citado é o da Mongólia, onde esse período de solitária pode chegar a 30 anos, deixando os presos completamente exauridos mentalmente. E, no Togo (África), doentes mentais são mantidos em celas escuras.
Ele relatou, também, casos em que doentes são mantidos presos junto com prisioneiros sãos. Citou o caso do Paraguai, onde disse que a ONU constatou casos de tuberculosos mantidos em cela suja e escura, junto com outros presos. Já no Sri Lanka e na Indonésia, presos ainda são submetidos a castigos prisionais.
Demora da justiça
Nowack apontou, também, os casos de muitos paises em que os presos cumprem pena antecipadamente, sem julgamento. Citou o caso da Nigéria, observando lá existirem 20 mil presos que já cumpriram o tempo que a uma eventual sentença judicial lhes imporia, e onde o juiz, ao julgá-los, os sentencia exatamente às penas já cumpridas, para aliviar o sistema prisional.
Diante dessas situações, o representante da ONU encareceu a necessidade de a Organização rever as recomendações minimas para tratamento de presos estabelecidas na Convenção de Genebra, de 1955. Essas novas regras, segundo ele, ao contrário das recomendações de 1955, que são voluntárias, têm que ter um caráter vinculante.
Metas
O coordenador-geral do Brasil na Fundação Penal Internacional, professor (da Universidade Federal do Amazonas) Edmundo Oliveira, disse que, entre as metas que a ONU prepara para o milênio a serem concluídas até 2015, figura o estabelecimento de estratégias para reduzir os quadros de miséria, exclusão e insegurança hoje vivido por boa parte dos presos no mundo.
Ele preconizou, entre outros, um maior comprometimento dos governos na execução penal e no seu aperfeiçoamento e uma atenção às mutações internacionais dos valores humanos na vida prisional.
Criminalidade
O ministro Eugenio Raul Zaffaroni, da Suprema Corte da Argentina, disse que, nos últimos anos, tem havido um aumento preocupante da prisão de homens jovens, em faixas etárias e sociais prejudicadas pela ausência de oportunidades de trabalho e estudo, também objeto de racismo e de diversas outras formas de discriminacao. Relatou que, em virtude desse aumento da criminalidade, há casos, na América Latina, de colocação de presos em contêineres, por falta de espaço nos presídios.
Essa situação, segundo ele, reflete problemas tanto no sistema penitenciário quanto no judiciário. Ele atribuiu essa situação também ao fato de que se trata de um grupo de países em fase de desenvolvimento. Portanto, precisam de grandes investimentos em transporte, energia e telecomunicações, e não lhes sobram recursos para seus sistemas carcerários.
Ele disse que os exemplos da privatização de presídios, o que seria uma alternativa, não têm sido encorajadores, porque eles mostraram um encarecimento de gastos com a manutenção de presos. Uma opção por ele sugerida seria o estabelecimento de um teto para o período de detenção, restringindo-se a privação da liberdade aos crimes mais graves.
Durante o workshop, foram apresentados alguns casos encorajadores quanto a medidas de redução da reincidência. Foi relatado o caso do Canadá, que implantou um sistema de visitadores voluntários a presídios e de treinamento de pessoal para atuar junto aos presos. Tais atividades permitiram reduzir de 40% para 25% o porcentual da reincidência, nesses presídios.
O vice-presidente do Comitê da ONU sobre Tortura, Mario Coriolano, propôs um maior controle para reduzir o numero de presos não sentenciados nas prisões, assim como a intensificação das visitas periódicas de representantes da ONU aos países membros para colher informações sobre seus sistemas carcerários.
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